Nicolau Steno
(1638-1696)
No
século XVII, receosos de perseguição movida pela Igreja, ainda eram muitos os
estudiosos que, convictos ou não, rejeitavam aceitar os fósseis como sendo
restos de amimais ou plantas do passado. Um deles, o naturalista e químico
inglês Robert Plot (1640-1696), no livro que publicou em 1677, Natural History
of Oxford-Shire, descreveu um fémur de dinossáurio como sendo de um elefante
deixado no terreno pelos invasores romanos.
Ao
contrário desta visão, o dinamarquês Nicolau Steno (1638-1696) deu um grande passo
no sentido do conhecimento científico, ao recuperar as ideias de Da Vinci e de Palissy. Médico de
profissão, com obra notável nos campos de geologia e da mineralogia, Steno já
verificara que certos “petrificados” eram semelhantes entre si, quaisquer que
fossem as rochas em que estivessem embutidos, e que, por outro lado, tinham o
mesmo aspecto das partes dos animais a que se assemelhavam. Ao observar os
dentes de um tubarão actual, Steno verificou que estes eram muito semelhantes a
certos objectos encontrados em rochas sedimentares na Ilha de Malta, então
chamados glossopetrae (línguas petrificadas), uma vez que faziam lembrar
línguas de serpente transformadas em pedra.
Cabeça do tubarão branco, numa xilogravura de Nicolau Steno,
de 1667
Depois de dissecar a cabeça de um gigantesco tubarão branco
capturado em Itália em 1666, Steno mostrou que os glossopetrae eram dentes de
antigos seláceos do mesmo tipo, caídos no fundo do mar, aí conservados no seio
dos sedimentos e depois trazidos à superfície incluídos no seio da rocha em que
esses sedimentos se haviam transformado. Esta explicação de Steno marca o
começo da interpretação biológica dos fósseis, que vingou e teve pleno
desenvolvimento, em especial, no século XVIII. Considerado um dos fundadores da
paleontologia, é sua a frase “os corpos encontrados na terra que se assemelham
a plantas e animais têm a mesma origem que as plantas e os animais a que se
assemelham”. Esta afirmação, hoje evidente, representou, para a época, uma
inovação e um romper com as ideias do passado. Com esta frase, inovou o
conceito paleontológico de fóssil, no que foi apoiado pelo filósofo alemão
Gottfried Wilhelm von Leibniz (1646-1716) e pelo físico e naturalista inglês
Robert Hook (1635-1703), lembrado como uma das figuras chave da revolução
científica do século XVII.
Steno postulava que, se as conchas e outros restos de antigos
seres vivos encontrados nas rochas de uma dada região são despojos de animais
marinhos, as camadas que os contêm são necessariamente marinhas, concluindo que
o mar ocupara essa região. Com estas afirmações, e embora sendo respeitador do
tempo bíblico e dos relatos das Sagradas Escrituras, inovou também o conceito
de fácies, definida como o conjunto de características paleontológicas,
mineralógicas ou outras que permitem conhecer o ambiente em que a rocha se
formou. Para muitos dos seus contemporâneos, era intrigante o facto de um
animal petrificado e, portanto, sólido, estar dentro de uma rocha também ela
sólida. No livro que publicou em Florença, em 1669, “De solidus intra solidum
naturaliter contento dissertationis prodromus”, Steno deu a necessária
explicação a este problema e ao levantado por outros corpos sólidos (cristais,
veios, filões, camadas, encraves) embutidos no interior das diversas rochas.
Galopim de Carvalho