sexta-feira, 29 de abril de 2016

A ESCOLA UMA CONTRA-SOCIEDADE?


                                       


Régis Debray (Paris, 1940) é um filósofo, jornalista, escritor e professor francês que foi amigo de Fidel Castro e Che Guevara, pertenceu ao Partido Socialista Francês, do qual se distanciou por diferenças ideológicas com o ex-presidente François Mitterrand. Actualmente, Debray lecciona na Universidade de Lyon.
Acontece que, em Junho do ano passado, ele deu uma longa entrevista ao semanário Marianne na qual, numa curta passagem, se refere à educação como “tendo que ir ao fundo, para além das questões dos programas, dos horários, da interdisciplinaridade… E o fundo é que a escola não pode ficar fiel ao seu próprio fim, afirmando-se como uma contra-sociedade.” Debray diz, ainda, que ela “decalca a sociedade do mercado, da urgência, do utilitarismo, da rentabilidade da imagem”, colocando, por fim, a questão de “como é que uma sociedade pode produzir no seu seio uma contra-sociedade?”
 O texto atrás transcrito suscita múltiplas questões e dúvidas sobre a finalidade da escola. Assim, “ir ao fundo” das questões escolares significa desprezar os programas? Não serão estes as directivas, melhores ou piores, que encaminham o conhecimento aos alunos? Quanto aos horários, é certo que eles poderiam ser sempre elaborados de maneiras diferentes, mais ou menos flexíveis. Mas eles constituem as balizas dentro das quais a aprendizagem escolar se faz. Relativamente à interdisciplinaridade ela é hoje considerada, mesmo ao nível do ensino superior, um instrumento que permite ao aluno ter uma visão mais global, segundo várias perspectivas, do conhecimento.

Quanto à escola decalcar “a sociedade do mercado, da urgência, do utilitarismo, da rentabilidade da imagem”, significa isso que ela deve alhear-se do que à sua volta se passa, preparando os jovens para um mundo irreal? Claro que a escola não deve limitar-se a copiar as características do mundo de hoje. Mas é através de uma disciplina participada, no oferecimento de condições para que o aluno seja um sujeito interventivo e não um mero agente receptivo, no ensinamento e prática de valores como a verdade, a liberdade, a responsabilidade, a tolerância, a solidariedade, a gratidão…que se consegue uma escola contra a sociedade dos nossos dias. 

                                            Mário Freire

terça-feira, 26 de abril de 2016

O SONHO E O RIO






Segue o Sonho rio acima
Corre a vida de mau jeito.
Se na corrente se inclina
Dá-se um naufrágio perfeito.

Desfila um manso cardume.
Deixa a água cor de prata.
Como a cinza vem do lume
Ódio é chama que mata.

Após o pranto, a bonança.
Na espuma rebenta a dança
Que enche a praia de má sorte.

E quando o cais dorme calado
Junto ao veleiro ancorado
Cai um silêncio de morte.

Aldina Cortes Gaspar

In “ PÂNTANO


sábado, 23 de abril de 2016

GENUINIDADE





Cauda fora, como o gato,
deixa quem é mentiroso.
Da verdade ser ele cioso
tal não prova. É um facto.

O aletófilo é credível:
Tem, na genuinidade,
cunho de veracidade,
não obstante ser falível.

Qual virtude a cultivar,
sente que um tal dever
vem de dentro; não de fora.

Onde o exemplo encontrar?
É tão simples: Basta ver
a criança que em nós mora.


João d'Alcor

quarta-feira, 20 de abril de 2016

QUE DISCIPLINA DE ECOLOGIA PARA AS NOSSAS ESCOLAS?


                              



O Papa Francisco publicou uma encíclica (Louvado sejas, Editora Paulinas, 2015) em que se debruça sobre o que está a ocorrer no planeta Terra, devido à imoderação com que o homem trata o ambiente e propõe, à luz do Evangelho e da doutrina da Igreja, soluções para uma sociedade com menos desigualdades sociais, menos agressiva ao homem e ao ambiente e mais promotora do Bem Comum.
Mas, o que é que a Ecologia tem a ver com as desigualdades sociais e ser promotora do bem para todos? Na verdade, se observarmos os programas de disciplinas de Ecologia e de Ciências da Natureza nos ensinos básicos, secundário e superior, eles afloram, de uma maneira geral, os temas ecológicos segundo uma perspectiva muito redutora, considerando essencialmente aspectos técnico-científicos, não dando o salto para os problemas sociais advenientes de um desequilíbrio, provocado pelo homem, no ambiente.
A poluição e as mudanças climáticas, a questão da água, a perda da biodiversidade, a deterioração da qualidade de vida humana e a degradação social, a desigualdade planetária são alguns dos problemas que o Papa Francisco levanta logo no primeiro capítulo da sua encíclica.
Afinal, a que estamos hoje a assistir? Combatem-se as consequências de uma indústria poluidora com produtos antipoluentes de uma outra indústria que polui; para um estilo de vida frenético que põe em primeiro lugar o dinheiro, receitam-se tranquilizantes que intoxicam; as enfermidades que afectam as culturas vegetais atacam-se com pesticidas que provocam doenças no homem. Enfim, combate-se um mal, muitas vezes fonte de lucros só para alguns, com outro mal que continua a dar lucro agora, para outros e, às vezes, até para os mesmos. E tudo isto em nome do progresso, sem se atenderem às verdadeiras causas dos desequilíbrios existentes.
Há, pois, que desmontar toda uma engrenagem exploradora que nos amordaça. Há que tornar o sistema de ensino, do básico ao superior, um agente de transformação de um novo estilo de vida. E, para isso, muito pode contribuir uma perspectiva ecológica transdisciplinar que não descure o homem e a sociedade.


                                                Mário Freire 

domingo, 17 de abril de 2016

RESPEITO PELO AMBIENTE OU OPERAÇÃO DE MARKETING ?




            As espécies animais e vegetais estão em declínio; em consequência, não só a biodiversidade do planeta mas também as reservas de alimentos e de água potável de que dependem milhões de pessoas, estão em risco. Nos países ricos, a maior parte dos habitantes depende sobretudo das espécies domésticas para a sua alimentação; tal não acontece nos restantes países em que ainda existem milhões de pessoas que dependem da caça e da pesca. Daí resulta que os ecossistemas estão sujeitos a fortes pressões, como resultado do crescimento demográfico e da exploração crescente dos recursos naturais. São, muitas vezes, utilizados métodos que destroem os habitats e conduzem rapidamente à extinção das espécies. Essa redução atinge um valor elevado nalgumas com interesse comercial. As espécies estarão cada vez mais ameaçadas e a nossa sobrevivência posta em risco se não forem respeitados os limites impostos pela natureza. Só assim será possível ter uma economia, desejavelmente, verde.
             As espécies invasoras representam uma séria ameaça à diversidade biológica. É necessário tomar medidas de prevenção e de sensibilização que previnam e promovam a erradicação destas espécies, quer à escala nacional quer à escala mundial de modo a limitar os prejuízos que elas causam. Em contrapartida, existem espécies que contribuem especialmente para a melhoria do ambiente. Por exemplo, uma árvore pode produzir num ano o oxigénio que dez pessoas respiram nesse mesmo período. Também os moluscos bivalves e algumas plantas aquáticas têm uma contribuição importante para a purificação da água das zonas húmidas. 
“O bater de asas de uma borboleta em Nova Iorque desencadeia uma tempestade em Pequim”. Esta frase tão popular refere-se ao “efeito borboleta” da Teoria do Caos. E qual é a relação desta frase com a extinção das espécies? Na ecologia ela é muitas vezes lembrada, pois que, por exemplo, a cadeia alimentar, é gravemente perturbada pela perda das espécies, e consequente desaparecimento dos predadores.

         O mercado e as empresas, também conhecem a importância que a biodiversidade tem para todos nós; daí a preocupação e o interesse que demonstram na preservação das espécies e a forma como fazem a sua divulgação, cativando desse modo clientes ambientalmente responsáveis. Por outro lado, as empresas na sua ânsia de aumentar os lucros, estão atentas às vantagens que poderão resultar da adesão à ideia de economia verde. Daí que uma grande cadeia de distribuição em Portugal, tenha anunciado recentemente com grande pompa e circunstância, que não será possível encontrar à venda nas suas lojas, espécies píscícolas que tenham sido declaradas em perigo de extinção.


                                    FNeves

quinta-feira, 14 de abril de 2016

PARTICIPAÇÃO E AUTONOMIA EM EDUCAÇÃO





                       
Têm tido lugar na Escola Superior de Educação de Lisboa reuniões de um grupo de pessoas ligadas à educação que não se conforma com a actual situação educacional do País. Esse grupo enunciou um conjunto de Princípios Orientadores e de Acção e elaborou algumas Propostas para a Melhoria da Educação. Esses Princípios e essas Propostas podem ser lidas no Jornal de Letras de 24 de Junho a 7 de Julho de 2015.
Nesse grupo falou-se “numa escola exaurida, donde desapareceu, para muitos alunos e professores, o gosto por aprender e ensinar, transformada em campo de treino para exames, sendo indispensável mudar este estado de coisas. Mas mudar como, quando todos estão fartos e cansados de tanta mudança absurda?” De entre os vários temas abordados, destacaria dois: a participação e a autonomia.
Quanto à participação, nenhuma escola está impedida, junto dos cidadãos, de lhes solicitar a definição dos objectivos da educação e as diferentes formas de os concretizar. A comunidade em geral não deve alhear-se do que se passa na escola porque dela sairão, bem ou mal, os cidadãos que tomarão o futuro nas suas mãos. Por outro lado, há que incentivar a participação dos pais, solicitando-lhes sugestões e propondo-lhes tarefas que possam contribuir para uma maior valorização da escola e dos alunos. Além disso, essa participação deveria estender-se aos alunos, propondo-lhes, por exemplo, que sugerissem itens que pudessem figurar no Regulamento da Escola. Uma maior participação nesse Regulamento implicaria uma maior responsabilidade no seu cumprimento.
Quanto à autonomia, a escola já não é, apenas, um espaço onde só se ensina e aprende. Ela desempenha funções no domínio da alimentação dos alunos, no seu apoio psicológico, na acção social, na detecção de maus-tratos… Por outro lado, ela tenta encontrar estratégias que procurem dar respostas a múltiplas situações de alunos provenientes de famílias disfuncionais ou com graves carências de vária ordem. Por isso, “a escola deve dispor de autonomia financeira, pedagógica e administrativa que possa fazer face às situações que se lhe apresentam”. O grupo propõe, ainda, que “a direcção dos agrupamentos deveria ser revista de modo a respeitar a especificidade dos vários graus de ensino e a idade dos que os frequentam.

Foram, apenas, dois tópicos que foram abordados. Muitos outros dos estabelecidos mereceriam, pelo menos, serem reflectidos e, se possível, concretizá-los. 

                Mário Freire

segunda-feira, 11 de abril de 2016

O QUE NÃO FAÇO






Impossível
Escrever para ti
Quando os meus versos se partem
À medida que passas.

Impossível
Talhar-te em espaços
Quando os meus esquemas
São estudos menores
Comparados à tua radiosa clarividência.

Impossível
Não ceder ao ceticismo
Não esfarrapar as palavras
Perante a arrogância das noites paradas
E das caminhadas sem resposta.

Impossível, ainda
Ir beber do teu vinho.
Entregar-me num gesto
E refugiar-me na primeira porta
Só por ter medo de pernoitar ao relento!...


In”PEDAÇOS”

Aldina Cortes Gaspar



sexta-feira, 8 de abril de 2016

GENTILEZA




Gentileza, qual conceito,
é um termo que cai bem.
Se encarada é a preceito,
não é coisa, mas alguém.

Ser gentil é, com certeza,
mais que simples convenção.
Tem seu teste a gentileza

no pulsar do coração.

Qual virtude, é fascinante.
Onde o estro que bem cante
variantes de tal tema?

Possa todo o meu apreço
ser, ao menos, um começo
de quem nela vê seu lema.

João d'Alcor



terça-feira, 5 de abril de 2016

VÍCIOS ALIMENTARES E SAÚDE PÚBLICA






A partir deste ano Portugal tem nova legislação que vem alterar o Código da Publicidade no que diz respeito à publicidade de alimentos nocivos para as crianças, à semelhança do que acontece noutros países europeus. São visados sobretudo os alimentos e as bebidas com alto conteúdo de açúcar, gordura e sal considerados como um problema de saúde pública. Estes alimentos e bebidas não poderão ser publicitados a menos de 500 metros das escolas nem nos 30 minutos anteriores ou posteriores a programas de televisão e de rádio infantis ou juvenis cujas audiências tenham um mínimo de 20% de público com idade inferior a 12 anos. Os termos da lei acrescentam que fica igualmente vedada a publicidade a alimentos ou bebidas de elevado teor de açúcar, gordura ou sódio na internet em sítios ou páginas com conteúdos destinados a um público infantil ou juvenil.
De facto, o consumo de açúcar, de sal e de gordura tem vindo a aumentar em praticamente todo o mundo desenvolvido de uma forma preocupante, sobretudo se tivermos em consideração os inúmeros estudos científicos que apontam para estas substâncias como sendo uma das principais causas do número crescente de crianças e de adultos com obesidade, diabetes, cáries e doenças cardiovasculares, agravando inclusive o estado geral de saúde durante o período de envelhecimento. O excesso da ingestão de carnes vermelhas processadas (hambúrgueres industriais, salchichas, enchidos, enlatados), açúcar, gordura e sal, bem como o consumo escasso de alimentos frescos, fruta e vegetais aumenta também o risco do cancro no colón.
Por toda a parte os produtos processados com elevado teor de açúcar, seja nos alimentos seja nas bebidas, tornaram-se o principal inimigo público dos sistemas nacionais de saúde. Neste contexto, a Direcção-Geral de Saúde apresentou uma proposta para reduzir o consumo de açúcar em Portugal: as saquetas individuais de açúcar utilizadas nos cafés e restaurantes vão passar a ter metade da quantidade, passando de oito para quatro gramas por embalagem.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que o consumo dos açúcares simples se situe abaixo de 10% das calorias ingeridas diariamente, advertindo que a redução dessa percentagem para 5% proporciona efeitos benéficos adicionais para a saúde. Segundo os dados disponíveis, estima-se que, em média, o consumo do açúcar pelas crianças em Portugal ronde os 25% das calorias consumidas diariamente, ou seja, cinco vezes mais do que o recomendado.       Para termos uma noção das quantidades em questão basta dizer que, em média, 5% das calorias diárias equivalem a 25 gramas de açúcar, que correspondem sensivelmente a seis colheres de chá. Ora, existem no mercado refrigerantes que podem conter em cada garrafa ou lata individual uma porção de açúcar equivalente a 10 colheres de chá. Quer dizer, uma só bebida destas faz-nos ingerir inadvertidamente mais açúcar do que a quantidade diária aconselhada pela Organização Mundial de Saúde.
Por outro lado, a OMS chama ainda a atenção para o facto de grande parte do açúcar consumido diariamente estar incluído em alimentos que não são considerados doces ou bolos, como as comidas processadas, os molhos industriais, as massas, as pizas e o pão. Por exemplo, são comercializados flocos ditos de cereais para crianças cuja percentagem de açúcares (patente nos rótulos de declaração nutricional) chega a ultrapassar os 40% da composição do produto embalado, quando o aconselhável para qualquer alimento processado seria não exceder as 10 gramas de açúcares por cada 100 gramas de produto.
Muitos açúcares encontram-se dissimulados nos alimentos processados com nomes distintos na declaração nutricional: sacarose, frutose, glicose, lactose, dextrose e muitos outros. Estas substâncias apresentam nomes diferentes porque têm uma composição química diversa, mas são todas igualmente nocivas porque originam o aumento do nível de açúcar no sangue interferindo com os ciclos naturais de insulina e neptina. O mesmo acontece com os adoçantes artificiais.
Estima-se que as doenças provocadas pelo elevado consumo de açúcares custem, em média, 5% a 10% do orçamento de saúde dos países industrializados. No Reino Unido, por exemplo, o número de doentes com obesidade e diabetes tipo 2 aumentou em 65% na última década, o que custa cerca de um milhão de libras por hora ao serviço nacional de saúde, sem contar com as consequências sociais das baixas médicas e o sofrimento individual de cada paciente. O Reino Unido tem hoje, oficialmente, mais de quatro milhões de diabéticos e uma média de 700 novos casos diagnosticados por dia. Cerca de 90% destes doentes tem diabetes tipo 2, relacionado com o excesso do consumo de açúcar e a falta de atividade física. Segundo dados publicados pelo respectivo serviço nacional de saúde, dois terços da população adulta britânica é obesa ou tem excesso de peso.
Os alimentos industriais processados com elevado conteúdo de açúcar, sal e gordura tornaram-se omnipresentes na vida contemporânea. Não precisam de ser cozinhados, são quase sempre saborosos, e por vezes são até mais baratos do que os alimentos naturais. Mas o preço a pagar pela ausência de uma dieta natural variada e pelo consumo sistemático e excessivo de grande parte destes produtos é enorme.
A obesidade infantil e juvenil tornou-se um dos problemas crescentes de saúde pública  das sociedades ocidentais. Limitar a publicidade massiva desses produtos é um primeiro passo importante, mas é certamente insuficiente. É necessário, em simultâneo, promover o consumo de alimentos naturais e educar as crianças na escola e no seio da família por forma a adquirirem hábitos alimentares saudáveis.
É hoje praticamente consensual na comunidade científica que o ser humano não tem gostos inatos. O gosto por determinados alimentos em detrimento de outros é adquirido desde a infância de acordo com certos hábitos familiares e culturais. Usar as guloseimas como recompensa para o bom comportamento infantil é uma lição que não se esquece ao longo da vida. É fácil aprender a gostar de alimentos doces a ponto de não podermos passar sem eles.
O açúcar é altamente viciante. Estudos recentes vieram demonstrar que a ingestão de açúcar liberta no cérebro humano substâncias químicas orgânicas que dão a sensação de prazer. As áreas do cérebro que são ativadas pela ingestão de açúcares são as mesmas que são ativadas pelo consumo de drogas como a cocaína ou a heroína. O consumo repetido e exagerado de açúcar na comida e nas bebidas pode assim tornar-se um vício equivalente a uma dependência química. Quanto mais refrigerantes ou doces se comem mais apetece comer.
Um vício alimentar traduz-se no desejo compulsivo de consumir determinados alimentos de forma excessiva e descontrolada. Quase sempre o indivíduo tem consciência de que a sua maneira de comer, ou de beber, é prejudicial à sua saúde e à sua forma física, mas não consegue conter-se. Tornou-se fisiológica e psicologicamente dependente.
Nestas circunstâncias, o aconselhamento psicológico pode ser tão importante quanto a orientação nutricional. Não é fácil, mas se os gostos alimentares são aprendidos e adquiridos também podem ser corrigidos e reaprendidos. Porém, a dependência fisiológica e psicológica de alimentos viciantes e nocivos como o açúcar, o sal e a gordura só pode ser combatida com eficácia quando a pessoa afetada reconhece que precisa de ajuda e está disposta a convocar a sua motivação intrínseca e a sua força de vontade no sentido da mudança de hábitos alimentares. A questão é particularmente delicada no que diz respeito às crianças e aos adolescentes uma vez que a sua falta de maturidade e a exposição permanente à publicidade nos meios de comunicação social, nos espetáculos e na internet contribuem para enfraquecer os mecanismos de defesa e de autocontrolo.


                  Rossana Appolloni

sábado, 2 de abril de 2016

O ENCANTAMENTO E O MISTÉRIO DA VIDA




No ensino da vida e nas suas diferentes formas, normalmente, estudam-se nos seres vivos, os órgãos, as funções dos mesmos, o seu modo de funcionamento, as relações entre eles. Mas para além disso, há que extrair do ensino da vida a coordenação precisa existente entre os diversos órgãos, assim como a inter-relação entre os diferentes seres vivos, sejam eles animais ou plantas.
Repare-se no seguinte exemplo: a concentração de açúcar no sangue mantém-se constante ainda que não haja ingestão de açúcares. A concentração mantém-se também constante, apesar de uma ingestão excessiva de açúcar.
 Ora, o que leva, em última análise, um organismo saudável a manter o seu funcionamento regular? A resposta a esta questão está num princípio que rege os seres vivos e que é chamado de regulação e homeostasia. Este princípio baseia-se no conceito de flexibilidade dos órgãos de modo a manter-se um equilíbrio entre as mudanças que ocorrem em partes do organismo, em resposta às mudanças das condições externas. O equilíbrio leva à estabilidade do organismo como um todo. Ora, esta estabilidade, resultante da flexibilidade dos órgãos, conduz a que, por exemplo, quando se destrói parte do cérebro, as regiões adjacentes podem assumir algumas ou todas as funções da região destruída.
Este princípio da regulação e da homeostasia que regula os seres vivos é, de facto, assombroso e, a par dele, muitas perguntas poderiam ser feitas sobre o aparecimento e funcionamento da vida. Muitas delas ainda ficam sem resposta.
Mas se nos voltarmos para uma unidade da vida que se chama célula, aí as questões que se levantam continuam a ser complexas. Ela que, normalmente, só pode ser observada ao microscópio, encerra uma multiplicidade de estruturas onde se armazena energia, onde têm lugar inúmeras reacções químicas e muita informação. O seu núcleo tem abundante informação sob a forma de ácidos nucleicos (por ex. o ADN), os quais vão orientar sínteses proteicas e a explicitação dos vários caracteres de um organismo.
É este mistério que envolve a vida que merecia ser reflectido na escola e não se ficar pela mera descrição morfológica ou funcional dos órgãos. Aulas interdisciplinares com professores de biologia, filosofia e religião e moral bem poderiam discutir sobre o sentido da vida e que tipos de lições se poderiam retirar para a conduta humana.


                                                                   Mário Freire