quarta-feira, 30 de março de 2016

NO TEU OLHAR





Na perícia dos teus olhos
Estão as rotas dos caminhos
A força dos ventos
A sabedoria do mar.
À sombra dos teus dedos nasce a luz
A ternura, a arte
O perfume dos malmequeres.
Se olhares a Norte
Poderás desbravar os nevoeiros
Amansar as tempestades
 Sobreviver aos naufrágios.
Se virares a Sul
Tornarás mais luminoso o arco-íris
E pintarás com essas cores, cada manhã.
…………………………………………………………….
A brisa ficará quieta na margem
Crente de que dominarás os vendavais
E chegarás engalanado e vitorioso
Ao outro lado do Tempo!...


In”PEDAÇOS”

Aldina Cortes Gaspar






domingo, 27 de março de 2016

GENEROSIDADE




Bom que é ver alguém atento,
empenhado em bem-fazer,
comprovando, a cem por cento,
quanto o faz a bel-prazer.

No bem feito se percebe
ser ele fonte de alegria:
Une quem dá a quem recebe,
ambos pondo em sintonia.

Tal me leva a ponderar:
Generoso sou eu quando,
todo alma e coração,

tenho gosto em partilhar.
E o que é mais: A mim me dando.
Esse o auge da lição.


João d'Alcor

quinta-feira, 24 de março de 2016

ATENÇÃO PLENA





A atenção é o contrário de distração. É o contacto connosco próprios. É reconhecer o que sentimos perante os estímulos exteriores. E quando andamos distraídos não sentimos. Distraímo-nos para nos abstrairmos, porque é cansativo estar atento à vida. É cansativo olharmos para nós, ficarmos no sentir, questionarmos as escolhas que fazemos, assumirmos a liberdade de alterar tudo a qualquer momento. Preferimos não pensar, não sentir, não sofrer, não nos molhar… e vamos vivendo, ou melhor, sobrevivendo. Aceitar entrar no desconhecido assusta, mete medo, cria-nos insegurança. É melhor não... É melhor optarmos pelo seguro, pelo que nos é familiar e já conhecemos, pois assim sabemos com o que contamos. Como se a vida fosse uma escolha entre certezas e incertezas… como se a vida pudesse ficar imutável se escolhermos o conhecido. Resistimos. Resistimos. Resistimos. Quem não resiste entrega-se à batalha. Só os grandes guerreiros se disponibilizam às grandes batalhas. Batalhas que transformam a vida. Batalhas onde nada se perde, a não ser o que já não nos serve ao nosso propósito de vida.
Entrar numa batalha para ganhar traduz-se em perder logo à partida. O objetivo deste tipo de batalhas, ou desafios, não são a vitória sobre um inimigo, mas sim um enriquecimento, uma transformação, no contacto com os outros, que não são nossos inimigos, mas sim ferramentas para conseguirmos concretizar as nossas aprendizagens, sendo que aprender e crescer implica superar obstáculos que tendemos a ver como externos, mas que, na verdade, são apenas internos. Já só reconhecê-los é difícil, implica atenção e perseverança num trabalho de olhar para si próprio, o que nem todos estão dispostos a fazer.
 Para os desafios nos enriquecerem há que estar dispostos a ser afetado, no sentido de estar interiormente aberto para que determinado momento possa provocar uma mudança. Entregar-se ao momento, deixar que ele nos afete, acolher sem resistências para sentirmos a intensidade da vida, no que ela tem de transformador, é só para quem tem a grande vontade de valorizar e honrar a própria existência. Quando nos abrimos aos momentos e nos deixamos afetar é sempre uma oportunidade para que o desconhecido passe a conhecido. Mas até que ponto nos queremos conhecer? Na mesma exata medida em que nos permitimos ser afetados pelos momentos que passam por nós. Ou os apanhamos e corremos o risco de uma caminhada cada vez mais feliz, ou os deixamos ir, na ilusória certeza de que a nossa vida continuará a mesma de sempre.

Rossana Appolloni
www-rossana-appolloni.pt


segunda-feira, 21 de março de 2016

DE JOVENS PARA CRIANÇAS







Reconheço que nestas minhas crónicas não tenho dedicado o espaço adequado à Pequena Infância. E, no entanto, ela é, mais do que as outras idades, merecedora da maior atenção. Na verdade, durante a infância estrutura-se a pessoa que há-de vir a ser como adulto, seja sob os pontos de vista físico-motor, afectivo ou cognitivo. Do modo como decorrem os primeiros anos de uma pessoa dependem, em boa medida, os seus êxitos e fracassos na vida profissional e nas relações que estabelece com seus semelhantes.
As relações mãe-filho são, de sobremaneira, importantes. A atitude materna desempenha papel relevante nas características afectivas da criança. De um modo geral, a família pode exercer uma influência facilitadora ou inibidora do desenvolvimento global da criança. Se facilitar a sua iniciativa e a sua segurança, reforça o seu desenvolvimento; se, pelo contrário, a iniciativa e a segurança da criança forem relegadas para segundo plano, o seu desenvolvimento ficará comprometido.
Vem este preâmbulo a propósito de um projecto, o Projecto PI (Pequena Infância). A ideia de divulgar o teatro no universo infantil, promovendo o conhecimento de algumas das suas características e difundir os mitos clássicos constituiu uma linha de força para pôr o Projecto em marcha. Na verdade, os promotores do Projecto – alunos de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra – “acreditam que esses mitos conservam o poder pedagógico de outrora, garantindo, assim, o acesso ao conhecimento de um substrato cultural que fascina a humanidade há vários séculos”.
As oficinas de expressão dramática exploram temas do mundo clássico greco-romano, razão pela qual têm sido apresentados e explorados imaginários greco-latinos, como a viagem e as aventuras de Ulisses, o cavalo de Tróia, a teia de Penélope e os mitos de Minos, Narciso e Pandora, os Doze Trabalhos de Hércules, a Descida aos Infernos de Teseu, o Labirinto do Minotauro, entre outros episódios.
Este Projecto dirige-se a crianças entre os 4 e 10 anos. A exploração das potencialidades da expressão dramática é um dos objectivos do grupo, pois ela é um agente pedagógico importante, na medida em que incentiva a criatividade artística, o autoconhecimento, as capacidades motoras, expressivas e criativas, a alfabetização estética e ética.
Eis um Projecto em que, de um modo gratuito, jovens universitários colocam os seus tempos livres e conhecimentos ao serviço das crianças. Um exemplo a seguir!


                                                              Mário Freire

sexta-feira, 18 de março de 2016

ESTRANHAS MARÉS





Desfaleço
À míngua de espaços
E desfaço-me presa ao oceano
Sem poder acompanhar
A rota das gaivotas.
Oiço contar que,
Lá longe
Onde o céu segura o mar
Passam cardumes clandestinos
Desfilam as sereias
E masturbam-se os piratas
Na proa das galés.
………………………………………..
…Se houvesse um temporal
Não me sentiria tão desolada.
Morro à míngua de espaços.
Deixai-me voar!...


In”PEDAÇOS”


Aldina Cortes Gaspar

terça-feira, 15 de março de 2016

GÉNERO




Sendo Deus o nosso Pai,
Divindade a nossa Mãe,
como filho, saiba eu bem
nexo ver que a ambos vai.

Tal influi no meu pensar
relativo ao ser humano:
Evitar sempre o engano
de ambos sexos separar.

Feminino e masculino
são comuns a cada qual,
variando a percentagem.

Suprimir é algo indigno,
tendo em conta que, afinal,
Deus nos fez à sua imagem.


João d'Alcor

sábado, 12 de março de 2016

MOMENTOS ESCOLHIDOS






Há momentos cujo impacto é de uma intensidade tal que muda o rumo da nossa existência. Podem ser eventos dramáticos, como por exemplo um acidente, mas também uma simples frase ouvida, um olhar trocado, um gesto sentido. Há momentos que mudam a nossa vida para sempre, desviam-nos da direção prevista. Momentos destes estão sempre a acontecer, mas há alturas em que decidimos prestar-lhes atenção e colocarmos em questão o caminho que estávamos a percorrer. 
Qualquer que seja o momento, bom ou mau, alegre ou triste, é uma porta que, quando conscientemente aberta, nos permite aprofundar quem somos. São momentos que nos levam a elaborar perguntas sobre as nossas opções e se essas têm sido um reflexo do que desejamos, livres de condicionamentos e medos. Tudo o que nos acontece são oportunidades para pormos em causa os nossos pensamentos, sentimentos e atitudes. Será que são serenos, coerentes com a nossa essência mais íntima, ou será que são fruto de padrões de comportamento e defesas que carregamos às costas? E será que estaremos conscientemente presentes para reconhecer essa porta a abrir-se ou estará a nossa mente tão cheia de distrações que nem os vemos?
Para vermos essa abertura precisamos de escutar. E para escutar precisamos de parar, de entrar em silêncio, de contactar o nosso sentir e distinguir o que é nosso e o que nos foi colado de fora. Uma vida autêntica implica sentirmos a nossa essência para a conseguirmos exprimir no mundo, num movimento de exploração interior, de descoberta do que andamos aqui a fazer, para onde queremos ir, do que queremos aprender, conquistar e expressar. Pessoas para quem a vida é apenas uma sucessão de momentos do nascimento até à morte, cujo propósito não lhes toca, são pessoas que passam pela superfície das águas sem mergulhar. Não ficam molhadas, mas também não conhecem a beleza que se esconde nas profundezas do mar, não conhecem a sensação de sentirem o corpo em contacto com a água… Pelo contrário, pessoas atentas deparam-se constantemente com momentos de abertura à mudança. Ter a disponibilidade para nos entregarmos a momentos que nos fazem pôr em causa a nossa visão do mundo abre-nos para uma vida mais estimulante e significativa. Momentos que questionam o nosso sentir. Momentos que alteram a nossa caminhada no trilho da vida. Momentos que se tornam marcos no nosso percurso. Momentos escolhidos.

                                                        Rossana Appolloni
                                                   www-rossana-appolloni.pt
 

quarta-feira, 9 de março de 2016

AS OMISSÕES DE UM INQUÉRITO EDUCACIONAL DE ÂMBITO INTERNACIONAL





Refiro-me a um inquérito feito pela HSBC a pais de alunos de 15 países de todos os continentes, excepto África. Lembro que aquela sigla identifica uma das maiores organizações de serviços financeiros e bancários do mundo.
Sem entrar demasiado no conteúdo desse inquérito, refira-se nele a ausência de qualquer país do continente africano. Será que “O valor da educação – trampolim para o sucesso”, tal como é intitulado o relatório que analisa as respostas do inquérito, não tem aplicabilidade à população africana, precisamente aquela que mais precisaria da acção transformadora da educação?
Na análise do inquérito apresentam-se percentagens que indicam que a Matemática, as Ciências e o Inglês são os ramos do saber que os pais mais valorizaram no ensino primário. Mais uma vez ocorre uma omissão que, julgo, de grande significado: a ausência de referência ao ensino da língua materna. Ora, este ensino é fundamental para que a criança possa desenvolver a capacidade de se expressar oralmente, de entender os textos que lê, de os produzir, de expandir, enfim, as suas capacidades cognitivas e relacionais. Como entender, então, esta omissão?
Na análise feita não se mostra aquilo que, directamente, foi inquirido. Fica-se, pois, na dúvida se esta omissão é devida a uma ausência de um item específico ou se os pais dos alunos desvalorizaram esta aprendizagem. Esta última situação, no entanto, parece-me não deve ser colocada, uma vez que muitos dos países inquiridos ou são de língua materna inglesa (Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália) ou terem pertencido ou mantido relações próximas com o império colonial inglês (Hong Kong, Índia, Singapura, Malásia).
Será que os autores do inquérito já estão a partir do princípio de que a língua inglesa será aquela que irá substituir as línguas maternas, pelo menos nos países cujos PIBs per capita sejam dignos de figurar nas estatísticas internacionais?


                                 Mário Freire

domingo, 6 de março de 2016

ESQUECI-ME DE VOAR






Pedi que no Outono se formassem
Tapetes de gaivotas sobre o mar.
Que os barcos parados não ficassem
Querendo desistir ou ancorar.

Pedi às aves todas que se fossem
Alertei que o mau tempo ia chegar.
Que as pétalas, caladas, se escondessem
Temporal as podia derrubar.

Alertei toda a terra, o firmamento
Tão veloz quanto pode o pensamento
Ao pé de cada ser nos transportar.

Tudo partiu, o mar se recolheu.
 O Inverno chegou, só estava eu
Exausta, esqueci-me de voar!...


Aldina Cortes Gaspar

quinta-feira, 3 de março de 2016

ÁGUA CRISTALINA NOS HIMALAIAS. ÁGUA MORTAL NO BANGLA DESH





            No mês passado, tive a oportunidade de participar nas actividades dum projecto comunitário Erasmus Mundus, coordenado pela Universidade de Évora que, entre outros, tem como objectivo trazer à Europa investigadores de universidades asiáticas. 
            Houve um dia livre dedicado a mostrar o Alentejo aos participantes vindos de países tão distantes como a Índia, o Nepal, o Paquistão, o reino do Butão e o Bangla Desh. Os Himalaias foram tema de conversa; falou-se não só de alpinismo, mas também do facto de as neves eternas dos Himalaias, constituírem a maior reserva de água doce do mundo logo a seguir ao Ártico e à Antártida; alimentam os principais rios da Ásia nomeadamente o Ganges, o Mekong e o Yangtsé. Com excepção do Ganges, todos eles nascem no planalto tibetano, sob controlo chinês. Em conjunto, aqueles rios contribuem para a alimentação de água doce de dois mil milhões de pessoas.
            Tal como no Ártico e na Antártida, aquele reservatório de água gelada sofre os efeitos das alterações climáticas. Pensa-se que nos últimos cinquenta anos, quase todos os glaciares do planalto tibetano perderam em superfície e que, dois terços dos glaciares do planalto tibetano, poderão desaparecer até 2050.
            Mas as alterações climáticas, não são a única ameaça: no Bangladesh, um dos países mais pobres do mundo, o sub-solo contém quantidades apreciáveis de arsénico, veneno violento bem conhecido de filmes de espionagem. Custa a crer, mas nos anos 70 o governo com financiamento da Unicef, levou a cabo a abertura de poços em larga escala para, desse modo, evitar o consumo de água superficial de rios e ribeiras fortemente poluída. O que parecia um milagre, tornou-se um desastre: os lençóis freáticos de todo o país estão contaminados com arsénico. O governo procura soluções alternativas em colaboração com os países vizinhos, mas a rivalidade regional indo-chinesa, tem deitado por terra a resolução da questão de abastecimento de água potável no país. Em consequência, morrem por ano milhões de pessoas, muitas das quais crianças.

                                                 FNeves