Estava-se, então, nos finais dos anos 60, início dos anos
70. O Maio de 68, em França, tinha trazido uma certa irreverência não só aos costumes,
mas também a outras áreas da intervenção humana. Vivia-se, por isso, naquela
época, um desejo muito grande de fazer coisas novas no ensino secundário, muito
especialmente na área em que me situava, a das Ciências. Um conjunto alargado
de professores tentou, então, dentro dos condicionalismos existentes na altura,
alterar o satuto quo em que o ensino
das Ciências dormitava.
Acabava de ser lançado nos Estados
Unidos o Programa BSCS (Biological Sciences Curriculum Study) que pretendia
transformar o ensino da Biologia numa actividade de pesquisa em que o aluno,
usando os métodos da ciência, pudesse ser um construtor do seu próprio saber.
Desejava-se, ainda, que esta forma activa
de aprender pudesse, também, contagiar outras disciplinas de índole científica
e daí, se possível, passar para as ciências humanas, tendo em consideração,
claro está, os condicionalismos de cada área disciplinar. Para isso, haveria
que entrar no cerne da produção do conhecimento, nos questionamentos que a
realidade nos suscita e no uso de metodologias activas que conduzissem o aluno
a acrescentar algo ao que já estava estabelecido.
A Fundação Gulbenkian, muito especialmente
através de alguns dos investigadores do seu Instituto de Ciência, empenhou-se
em colaborar nesse querer ensinar a fazer ciência. Para se atingir tal
finalidade, foram efectuados cursos de Verão no Instituto de Oeiras,
sessões laboratoriais, discussões, paineis, conferências, enfim, um sem número
de actividades, apoiados pelos novos materiais que estavam a vir dos Estados
Unidos. Um novo professor de ciências estava a surgir no ensino secundário.
O que se pretendia, afinal? Que a ciência
não fosse encarada como um mero repositório de verdades inalteráveis, já
estando completa, mas algo que está sujeito a revisão, a contínua
reestruturação, à medida que surgem novos dados e estes se relacionam com os
antigos. E que o aluno fosse disso, mais do que uma testemunha, um actor. Será
que este espírito de inquietação, de dúvida, de questionamento e teste da
realidade, de que vive a ciência,
conseguiu permanecer no ensino que hoje se faz?
Mário
Freire