quinta-feira, 12 de setembro de 2013

BIODIVERSIDADE E GEODIVERSIDADE


            (No topo da capa de alteração da rocha, o solo
           estabelece a fronteira entre os mundos vivo e não
           vivo)              

Fala-se hoje muito de biodiversidade e ainda bem que assim é. Os biólogos têm sabido dar o devido relevo aos temas das suas investigações. O mesmo não acontece com a geodiversidade, palavra ausente no discurso oficial que, não é demais lembrar, constitui o suporte da biodiversidade, seja à superfície do planeta, seja nas profundezas oceânicas, onde ecossistemas muito particulares vieram revolucionar as nossas ideias sobre a origem da vida.
Numa primeira aproximação, geodiversidade pode ser entendida como o conjunto de todas as ocorrências de natureza geológica, com destaque para rochas, minerais e fósseis (testemunhos de uma biodiversidade passada), dobras e falhas, grutas naturais e galerias de minas, relevos e depressões terrestres e submarinas, vulcões, etc.
Em terra e em condições favoráveis, agentes físicos, químicos e biológicos alteram a capa externa das rochas, dando origem ao solo, definido como um corpo natural, complexo e dinâmico, constituído por elementos minerais e orgânicos, caracterizado por uma vida vegetal e animal própria, sujeito à circulação do ar e da água e que funciona como receptor e redistribuidor de energia solar.
         No topo da capa de alteração da rocha, o solo estabelece a fronteira
 entre os mundos vivo e não vivo.
Entidade presente na imensa maioria das terras emersas, na interface da litosfera com a atmosfera e a biosfera, o solo estabelece, assim, a fronteira entre a geodiversidade e a biodiversidade à superfície da Terra. Sem solos não haveria prados, charnecas, tundras ou florestas, nem hortas, searas, montados ou olivais, nem toda a biodiversidade animal que nos rodeia.
Parte da atmosfera que nos assegura a vida é o resultado de uma interacção constante e contínua que sempre existiu entre os seres vivos e a cobertura gasosa do planeta. Muito diferente da actual, a atmosfera primitiva não tinha oxigénio. Foram organismos muito simples, como cianobactérias e algas marinhas microscópicas, que produziram, por fotossíntese, todo o oxigénio que viria a ser necessário à respiração dos animais. Trata-se de um processo que continua a ser assegurado por todas as plantas que nos rodeiam. É por isso que dizemos que os parques arborizados, no interior das cidades, são os seus pulmões. E é por isso que lutamos pela defesa das estepes e pradarias, das turfeiras boreais e de todas as florestas, de todas as latitudes e altitudes, das quentes e húmidas, como a amazónica, à taiga canadiana e siberiana, pois são elas que fabricam a parte mais importante do ar que respiramos.
As rochas, a água, o ar e os seres vivos ou, por outras palavras, a litosfera, a hidrosfera, a atmosfera e a biosfera conviveram entre si ao longo da história do “Planeta Azul”. Deste modo, a biodiversidade que hoje nos rodeia é uma consequência dessa interacção e, portanto, absolutamente dependente da geodiversidade.
Os recursos minerais, nomeadamente, os minérios de ferro, alumínio, cobre, zinco, chumbo, ouro e muitos outros, bem como as fontes energéticas, sejam elas os combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás natural), a geotermia ou o nuclear, foram e são determinantes na História da Humanidade. A prospecção e captação de águas subterrâneas e o conhecimento dos terrenos, com vista à construção de barragens, pontes, estradas e outras grandes obras de engenharia são outros suportes fundamentais da civilização. Todos estes domínios da geodiversidade e, ainda, a defesa do ambiente natural e a preservação do património geológico e paleontológico representam aspectos práticos ao serviço da sociedade em desenvolvimento sustentado, com profundas implicações económicas, sociais e políticas, à escala local, regional e global. Acresce ainda, e é bom não esquecer que, nos seus domínios fundamentais, a geodiversidade sempre teve papel de relevo no pensamento filosófico, desde a Antiguidade aos nossos dias.
Com tão grande importância na sociedade, não se compreende a mais do que evidente falta de cultura geológica dos portugueses, dos cidadãos mais humildes e iletrados às elites intelectuais mais iluminadas.
É claro que há excepções, o que só confirma esta realidade.

                                             Galopim de Carvalho