sexta-feira, 28 de outubro de 2011

VIAS DE REALIZAÇÃO - 4


Via artística

Designando esta como “via artística ou criativa”, Assagioli vê nela “a realização pessoal através da beleza.” A psicossíntese faz desta via, ao mesmo tempo, uma ciência e uma arte, colocando-nos em contacto com a realidade ontológica do ser em que se conjugam o verdadeiro, o bom e o belo. Dá isto lugar ao sentido estético que transforma, eleva e integra a caducidade da forma no domínio do essencial. Insere-se a arte na perenidade intrínseca da realidade onde se conjugam a contemplação com o êxtase e a inspiração com a expressão.
A arte é mãe da originalidade a nível transpessoal e da surpresa a nível da personalidade. Goethe considera que “o artista deve fazer surgir da profundidade do seu próprio ser a forma e o conteúdo.” Porquanto criador, ele é inovador. Tal como Caliban, o personagem de Shakespeare, o artista se opõe, sistematicamente, a ficar refém da ordem estabelecida. O sentido da autenticidade e o apreço pela originalidade o identificam com o que exprime. Ele prefere não copiar nem se copiar. Na opinião de Picasso, “copiar dos outros é tolerável, mas copiar-se a si mesmo é inaceitável.” A arte é gerada no interior de nós mesmos. No seu Symposium, Platão considera que os verdadeiros artistas são aqueles ou aquelas que dão à luz uma nova realidade.  
É no ser, mais do que no agir que a arte se alicerça e se exprime. Roberto Assagioli observa: “Na vida, geralmente, ‘nos damos a permissão de viver’, enquanto que viver é uma arte e devia ser a maior das belas-artes.”  Na sua perspectiva, “a psicossíntese é ciência e arte.” É particularmente pela via estética ou criativa-artística que nos podemos tornar, segundo a expressão de Sergio Bartoli, “os artesãos responsáveis e conscientes da nossa auto-realização.” A responsabilidade faz apelo à vontade, por vezes apontada, na tipologia dos artistas, como deficiente ou intermitente, em vez de abulia pode traduzir insatisfação e porventura rebelião a nível da personalidade, face às dificuldades de expressão. A beleza é considerada uma das características divinas comunicada a tudo que existe. Importa então confiar no domínio transpessoal referido por Alberto Alberti como detentor de “uma experiência de síntese e de beleza.”

                                            João d’Alcor