quinta-feira, 13 de setembro de 2012

UMA QUESTÃO DE CIDADANIA


Nestes últimos dias o País foi confrontado com o anúncio de um certo número de medidas que irão atingir o povo português, especialmente as classes médias e médias-baixas. E tudo isso em nome de uns certos números designados por défices orçamentais. Senti, como cidadão, a necessidade de não ficar calado.
            Não pretendo vir aqui denunciar aqueles que, desde longa data até aos nossos dias, nos atiraram para esta situação de indigência e de mão estendida. Nesta altura, mais do que atirar pedras aos culpados, urge encontrar soluções em que impere o realismo, a justiça e o bom senso.
Reconheço que algo há a fazer e que todos mas, fundamentalmente, os que mais podem, têm que contribuir para retirar o nosso País deste atoleiro em que os nossos políticos o meteram.
            Ora, segundo me vou apercebendo, estão a prescrever-se para a cura dos nossos males receitas que se inspiram em modelos teóricos, ainda não testados. Por outro lado, elege-se uma meta, de natureza puramente arbitrária, a do estabelecimento de um determinado défice orçamental. E, a partir daqui, tudo tem que ser feito para ser atingido esse número. Custe o que custar!
            E se tal receita conduzir à falência de muitas pequenas e médias empresas? E se o atingir desse número implicar uma avalanche de despedimentos? E se o alcançar dessa meta, que poderia ser outra, conduzir a maior pobreza e a maior desigualdade social? Não interessa, dizem os nossos governantes! O que é preciso é alcançar a meta estabelecida!
            Pergunto-me, então, a mim próprio:
            - As pessoas estão ao serviço dos números ou são estes que têm que estar ao serviço das pessoas? Dito de outra forma: estes números, que nos apontaram para atingir, implicam empobrecimento, desemprego, ruína da economia, angústia…Mas, por hipótese, se esse número fosse um outro, um poucochinho mais dilatado, então as consequências não se alterariam significativamente para melhor?
Continuo a perguntar-me da razão por que não se conseguiu essa pequena alteração. Em nome de quê ou de quem é isto feito ao povo português?
            Mas as minhas perguntas continuam: em que país foi testada a tese de que aquilo que às grandes empresas é oferecido, à custa do trabalho de todos, vai imediatamente ser canalizado para a criação de emprego? Será que Portugal é um país bom para, em tempo de grande crise económica e ruína financeira, se fazerem experiências que, no mínimo, parecem apontar para grandes iniquidades? Onde tal já foi feito e com bons resultados?
            Haja bom senso, respeito pelos que trabalham, humildade para ouvir opiniões sabedoras e de sabedoria e realismo para não confundir as pessoas com os números!

                                                       Mário Freire

terça-feira, 11 de setembro de 2012

SERÁ QUE O DINHEIRO CONTRIBUI PARA A FELICIDADE ? - 1


Vários estudos realizados relativos à relação entre o dinheiro e a felicidade chegaram à conclusão que a partir de um certo nível de rendimentos que satisfaça as nossas necessidades da vida, o dinheiro não é garantia de felicidade. Paradoxalmente, apesar de algumas pessoas terem um bom nível de prosperidade material, sentem-se mais infelizes do que outras que lutam para conseguir melhorar a sua vida.
Quem procura melhores condições de vida sente uma motivação interior que lhe dá a energia e o entusiasmo para lutar por um futuro melhor. O problema é que depois de se atingir um certo patamar de riqueza, uma pessoa facilmente se habitua e torna-se mais difícil procurar novas formas de se ser feliz. Acredita que não pode desejar mais, pois conquistou o que todos parecem ambicionar nesta sociedade capitalista: ter dinheiro.
É verdade que uma pessoa com dinheiro tem mais condições de obter o que deseja, seja em adquirir bens materiais, conforto individual e privilégios sociais, seja em proporcionar segurança para a família. Há quem acredite que a riqueza pode comprar a felicidade, o que não é de todo errado, pois ter dinheiro permite-nos fazer coisas que contribuem para o nosso bem-estar. No entanto, já se concluiu que o aumento de rendimentos não é proporcional a um aumento de felicidade. Antes pelo contrário! Uma pessoa materialmente rica mais facilmente entra em depressão por dois motivos: sente um vazio interior por não poder desejar mais do que o que já tem; sente-se em culpa porque tem tudo o que sempre quis e mesmo assim não se sente feliz.
O que nos faz sentir bem é ter sonhos e lutar por eles, é aceitar desafios que nos põem à prova e nos obrigam a ultrapassar obstáculos. Então, se a riqueza material não nos leva à felicidade, porque será que somos tão obcecados com ela?

Rossana Appolloni

domingo, 9 de setembro de 2012

CONSCIÊNCIA



Pôr a mão na consciência,
qual um monstro a domar,
visto em termos de vivência,
não é fácil de aceitar.

Consciência é, sim, ela
nossa voz interior
que de facto interpela
qual um bom despertador.

Moralismo é, com frequência,
uma estranha prepotência,
gládio em riste, a amedrontar.

Pôs-nos Deus, no coração,
suave e clara, a distinção
entre amar e não amar.

                                       João d’Alcor

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A CULTURA E A IGREJA - 2



                            Criação artística, liberdade e eternidade

            A afectividade e a cognição são aspectos da personalidade que, ocorrendo noutros animais, é no homem que elas atingem um grau elevado.
Mas há um conjunto de outras manifestações que só os humanos têm possibilidade de realizar: são as de natureza artística. Elas constituem um testemunho do espírito, da vida para além da biologia, de fazer do ser humano alguém capaz de criar.
            A arte, nas suas formas mais puras, consegue, ainda, promover o diálogo, proporcionar emoções profundas que a tornam, nalgumas das suas expressões, intemporais. Essas formas de arte conseguem passar através dos tempos, quase tocando a eternidade. Mas, tocar a eternidade não é ir ao encontro daquele desejo de perpetuidade que muitos sentem e que as religiões abordam?
            Pois foi desta actividade criadora que aponta para caminhos que, não desprezando as preocupações do quotidiano, as ultrapassam, sugerindo pistas de alegria, de reconciliação e de paz, de que se falou, também, na 8ª Jornada Nacional da Pastoral Cultural.
A arte, nas suas mais diversas formas, procura a liberdade. É por isso que um poder prepotente, seja ele de natureza política, económica ou religiosa, é factor inibidor de autenticidade e de criação. O dom que nos distingue dos diferentes seres vivos é, precisamente, o da liberdade. Por isso, a criação artística, ainda que de tal nem sempre se tenha consciência, seja a actividade que melhor concretiza a afirmação bíblica de que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus. Não é por acaso que são a arquitectura, a pintura, a música, a dança e a poesia que melhor conseguem traduzir o louvor a Deus.   
A Igreja, na medida em que pretende intensificar o diálogo com a cultura, está a criar espaços de transcendência e de liberdade que a tornam mais próxima de todos os homens.

                                                  Mário Freire

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

CONFIANÇA


Bem disposto, decidido,
corajoso e paciente,
calmamente convencido,
não vacila e segue em frente.

Eis alguém que nos convence
que estimula e dá prazer.
O sucesso lhe pertence;
ele o cria, a bem dizer.

Tem derrota garantida
quem de facto não confia,
seja adulto ou criança.

Se há triunfo nesta vida,
é viver o dia a dia
pondo nela a confiança.

João d’Alcor

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

A CULTURA E A IGREJA - I


                                  Alegria e esperança para todos?

Há uma alegria e uma esperança para nós – O diálogo com a Cultura no espírito do Concílio – este foi o tema da 8ª Jornada Nacional da Pastoral da Cultura, a propósito do cinquentenário do início do Concílio Vaticano II. Esta Jornada serviu, ainda, para evocar a encíclica Gaudium et Spes. Esta é considerada como um texto profético, na medida em que, ao contrário do que muitos entendiam, considerou uma Igreja que está no mundo e é do mundo e se encontra profundamente solidária com a condição humana.
            Neste documento, logo no início, se diz que “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo.” É certo que a palavra alegria nem sempre fez parte do léxico da Igreja. E, nos dias que vão correndo, em que o desemprego se alarga e a pobreza aumenta, haverá muitos para quem o conteúdo dessas palavras, alegria e esperança, sejam difíceis de viver.
            O cristão tem um horizonte alargado, mesmo para além da morte. Mas esse “alargamento ” e o alcançar da alegria e da esperança só serão possíveis em ambiente de solidariedade para com os que precisam ou, dito de outro modo, naquilo que todos, entidades públicas e privadas, e cada um pode fazer para ajudar aquele que está necessitado e que, por vezes, está ali a seu lado.
                        
                                                                Mário Freire


sábado, 1 de setembro de 2012

SISTEMAS EDUCATIVOS E INSUCESSO ESCOLAR



Muitos sistemas educativos enfrentam desafios relacionados com a selecção dos estudantes e a sua colocação nas diversas escolas, tendo como base as suas características pessoais. Na realidade, a referida selecção académica influencia a aprendizagem: dela dependem os curricula, os professores e os recursos que lhe são afectos.
Nos sistemas educativos ditos polarizados, os estudantes provenientes de meios sociais diferentes são também colocados em escolas diferentes. Isso pode resultar não só da selecção inerente ao próprio sistema educativo, como também da distribuição espacial das populações com grupos sociais diferentes, habitando áreas distintas.
De referir que, por exemplo, nos países nórdicos as escolas têm, no que diz respeito à população escolar, uma estratificação social semelhante; o mesmo não se poderá dizer dos países do centro e do sul da Europa em que as diferenças entre escolas são significativas.
            É usual nos diferentes sistemas educativos, colocar os estudantes em diferentes níveis, em diferentes instituições e até em diferentes turmas de acordo com o seu desempenho. Estes procedimentos irão ter um impacto directo não só em termos de equidade, mas também em termos de sucesso escolar. Estas políticas variam de país para país, continuando a ser os países nórdicos aqueles em que elas são menos utilizadas.
Este agrupamento de estudantes de acordo com as suas capacidades é, com frequência, visto como dificultando a equidade educativa. De facto, tal política poderá afectar o sucesso educativo e prejudicar claramente as crianças com menos capacidades, a partir do momento em que elas deixam de ter oportunidade de contar com a proximidade dos mais capazes e de poder aproveitar o seu efeito estimulador.
Também o facto de serem apontados como menos capazes, pode fazer com que esses estudantes percam a motivação e o interesse pela escola, especialmente em níveis etários mais baixos, quando internalizam expectativas menos exigentes. Esses estudantes têm um aproveitamento cada vez menos satisfatório, podendo mesmo acabar por abandonar o sistema educativo.
Crianças provenientes de estratos sociais desfavorecidos são, por vezes, colocadas em turmas de tão baixas expectativas que, especialmente quando são muito jovens, os impossibilitam de atingir níveis sociais, culturais e linguísticos satisfatórios. No entanto, defensores dessas medidas argumentam que dessa forma as turmas são mais homogéneas, facilitando a tarefa dos professores.
Para assegurar que todos os estudantes têm acesso a escolas de qualidade permite-se, por vezes que sejam os pais a escolher a escola para os seus filhos, independentemente da área de residência. Os defensores desta medida argumentam que, desse modo, aumenta a competição entre escolas, levando-as a melhorar a qualidade de ensino, sem aumento de custos. Pelo contrário, há quem discorde, argumentando que desse modo aumentará o fosso entre as classes mais e menos desfavorecidas pois que estudantes com status social mais elevado, continuarão a promover as melhores escolas, muitas vezes privadas embora, em certos países financiadas com fundos públicos (caso de certos colégios em Portugal).
Concluindo, poder-se-á dizer que serão desejáveis políticas que reduzam a segregação socioeconómica não só entre alunos como também entre escolas sem que, desse modo, sejam reduzidas as expectativas em termos de sucesso educativo.

                                               FNeves