A nossa Terra, um dos quatro planetas rochosos
ou telúricos do Sistema Solar, tem nas rochas os seus principais constituintes.
O estudo destes “documentos” naturais é, pois, tema central da geologia.
As rochas a que temos
acesso directo representam uma pequeníssima mas importante parcela das
resultantes da respectiva diferenciação e, à semelhança da água, do ar e dos
seres vivos, são o resultado de imensas transformações, numa vasta e complexa
rede de interacções ocorridas ao longo dos cerca de 4670 milhões de anos da sua
história, plena de energia interna (sob a forma de calor) a que se adiciona
toda a que lhe chega através da radiação solar. Como escreveu, em 1998, o
malogrado Prof. Maurice Mattauer (1928-2009), “as rochas nascem, vivem e
morrem. Como nós, elas têm uma idade e uma história”.
Os conhecimentos
directos de que dispomos relativos às rochas da Terra limitam-se aos que se
obtêm do estudo dos afloramentos rochosos de que dispomos à superfície, das
amostras recolhidas em dragagens e perfurações nos fundos marinhos e das
retiradas do subsolo, quer em minas, quer através de sondagens. As respectivas
profundidades, que andam à roda de 3 km no primeiro caso e 11 km no segundo (na
península de Kola), podem considerar-se insignificantes, se comparadas com as
três a quatro dezenas de quilómetros de espessura média da crosta continental.
A imensa maioria das
rochas que podemos observar e colher (para estudar) nos referidos afloramentos
foram geradas na crosta continental em resultado de afundamentos próprios da
génese das montanhas, que podem ir até os 60 ou 70 km abaixo dos nossos pés e,
posteriormente, trazidas à superfície, na sequência da elevação das mesmas e,
subsequentemente, postas a descoberto pela erosão. Esta realidade permite-nos
inferir acerca da generalidade das rochas que integram a totalidade da crosta
continental.
Abaixo da crosta,
algumas rochas, oriundas dos níveis mais periféricos do manto superior,
afloram. Outras, existentes a muito maiores
profundidades, inclusive do manto inferior, têm, em certas situações,
possibilidade de ascender à superfície do planeta, onde as podemos observar.
Em qualquer dos casos,
há, certamente, diferenças entre o material chegado e exposto à superfície e o que
ele foi no local de onde foi trazido. Mesmo assim, desprezando possíveis
diferenças, os conhecimentos obtidos por esta via continuam a referir-se a uma
delgada capa externa, mínima quando comparada com os cerca de 6370 km de raio
desta quase esfera que é o nosso planeta.
Muitas vezes referido (erroneamente) por “rocha-mãe do diamante”, o
kimberlito é, sim e apenas, a rocha que, enquanto fluida, o transportou da
profundidade para a superfície. O kimberlito alterado tem coloração amarela,
sendo localmente referido por yellow ground, contrastando com a cor azulada da
rocha sã, designada por blue ground. É conhecido vulcanismo kimberlítico no
Arcaico, há mais de 2600 milhões de anos. Actualmente não existe actividade
desta natureza, tendo a erupção mais recente ocorrido há cerca de 55 milhões de
anos.
Com um raio de 3470 km
e cerca de 1/3 da massa da Terra, a participação do núcleo na génese e evolução
das rochas do planeta constitui um tema de investigação em curso. Sendo esta
geosfera interna uma entidade com cerca de 1/3 da massa da Terra,
particularmente quente (na ordem dos 6000 a 7000 oC), a sua influência na
petrogénese, ainda que indirecta, é um facto. Admite-se que do calor libertado
pelo núcleo, 90% é transferido através do manto até à base da litosfera, por
convecção. O dos 10% restantes é transportado por plumas provindas do manto.
Em Josephine County
(Oregon, EUA) aflora uma porção do manto e da crosta oceânica na sequência de
um carreamento por obducção. À rocha peridotítica desta ocorrência está
associada uma outra, a que foi dado o nome de josefinito, formada por uma liga
de ferro-níquel e por uma granada com cálcio e ferro (andradite). Rocha
muitíssimo rara, é interpretada por alguns autores como uma amostra oriunda de
regiões de alta pressão do manto inferior ou, mesmo, da fronteira com o núcleo,
transportada por plumas mantélicas até níveis mais superficiais. Estudos
geoquímicos focalizados nos isótopos de ósmio (186Os e 187Os) levaram os seus
autores (Brandon et al., Nature, Julho, 1998) a admitir que os basaltos das
ilhas havaianas resultam de uma pluma mantélica que traz para a superfície
materiais oriundos do núcleo metálico terrestre.
Galopim de Carvalho