Solidariedade e sobriedade
As primeiras páginas dos jornais e as notícias de abertura das televisões vão-nos apresentando situações em que as palavras “crise”, “austeridade”, “desemprego”…merecem destaque. E, na base destas e de outras palavras de significado semelhante, parece estar um debilitado crescimento económico e uma escassez de natureza financeira.
Mas será que na raiz de tantos males estarão apenas aspectos económico-financeiros? Não terá sido, antes, uma inversão de prioridades no desenvolvimento que se desejou imprimir à sociedade que conduziu a esta situação em que se colocou o dinheiro acima da pessoa, o lucro exagerado de alguns à frente do bem comum, a preocupação de cada um só consigo, como se o outro, o que está ao nosso lado, não existisse? Todos necessitamos uns dos outros. E tomar consciência dessa realidade conduz-nos à solidariedade.
Vivemos num mundo em que entidades financeiras sem rosto, determinadas exclusivamente pelo lucro, actuam sem qualquer regulação supra-nacional. Elas determinam a política e a economia dos países, principalmente as dos mais vulneráveis. “A sociedade cada vez mais globalizada”, diz Bento XVI na encíclica ‘Caritas in veritate’ “torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos”.
Ora a solidariedade, essa fraternidade activa, só é possível se houver sobriedade. E “sobriedade” tem a ver, no seu uso corrente, com temperança no comer, com frugalidade, com moderação, com ausência de artificialidade, com simplicidade. Por isso, no dizer do cardeal Tettamanzi, da diocese de Milão, “ela abre aos outros, enquanto diminui a importância que damos a nós mesmos … ensina a evitar as palavras gritadas e os tons excessivos, os consumos desenfreados que causam desperdícios e a avareza de quem acumula, indiferente à necessidade dos outros”.
Solidariedade e sobriedade, mais que duas palavras, são dois valores que, praticados pelos que têm o poder das nações, da economia e do dinheiro mas, também, por cada um de nós, talvez pudessem contribuir para um mundo com menos desigualdades sociais.
Mário Freire