Os espaços e os tempos
Há 30 ou 40 anos o saber encontrava-se devidamente organizado, quer no espaço, quer no tempo. Explico melhor: havia as bibliotecas que continham livros nos quais procurávamos satisfazer as nossas inquietações intelectuais ou emocionais; havia a escola onde o professor, com a autoridade que lhe conferia a sua posição, comunicava o seu saber, dizia ao aluno o que estava certo ou errado, fazia cumprir as normas vigentes. O espaço e o tempo estavam definidos e cada um sabia que para determinado tempo havia um espaço, fosse ele para aprender, divertir, interagir…
O que agora assistimos é que esses espaços e esses tempos deixaram de ter a correspondência que tradicionalmente lhes estavam reservados. Eles interpenetram-se sem que, com rigor, possamos dizer quais são os tempos a que correspondem determinados espaços e vice-versa.
O saber já não se encontra apenas na biblioteca, nem no professor, nem na escola. O aluno, através de um click no computador, tem acesso ao último progresso feito sobre um tema que tinha sido dado na aula, acrescenta informação àquela que lhe foi proporcionada e, até, corrige a informação que o professor lhe tinha fornecido na véspera sobre o assunto.
O adolescente conversa, em casa, a partir do facebook, com os seus colegas e amigos sobre a última banda a cujo concerto assistiu no Youtube; comenta a actuação da sua artista preferida no espectáculo que está a ser transmitido em directo, enviando sms a outros fans como ele e, no intervalo do espectáculo, acede à página do professor na internet que lhe indica as normas de um certo trabalho que tem de apresentar. Representação caricatural? Talvez não tanto!
É nesta multiplicidade de tarefas, em que imagens, sons e objectivos se misturam, que o adolescente de hoje procura a sua identidade, afirma o seu caminho e tenta encontrar as referências que lhe hão-de servir de suporte para as suas grandes decisões na vida.
Que papel, então, para os pais? E que pais?
E a escola e os professores, como lidam eles com a descentralidade e dessacralização do saber? Que papel lhes está reservado?
As respostas a estas e outras perguntas talvez sejam mais do âmbito da filosofia do que da educação. De qualquer modo, a filósofos, a educadores e a outros que se dediquem aos problemas da contemporaneidade lhes cabe dizer uma palavra.
Mário Freire