domingo, 13 de novembro de 2011

ALMEIDA FIRMINO - 2


                                  Fragmentos de vida

            Não, não sou biógrafo e, muito menos, poeta ou estudioso de poesia! Por outro lado, à distância de mais de 50 anos, quando as memórias das nossas relações já estão muito esbatidas, restando, apenas, uma amizade num tempo que já não existe, fica o dever de honrar a memória.
É com aquelas limitações que tentarei evocar alguns fragmentos da obra de Almeida Firmino. Para o fazer com a dignidade que o evocado merece, socorrer-me-ei da ajuda de alguém que, sendo poeta, também o conheceu. E conhecendo-o, também escreveu sobre ele: o poeta e escritor açoriano Victor Rui Dores.
            Almeida Firmino fixou-se, em primeiro lugar, na Ilha Terceira. O seu primeiro emprego foi o de operário na base aérea das Lajes. Concorreu, depois, ao lugar de escriturário dos Quadros de Pessoal dos Tribunais, ficando a trabalhar no Tribunal da vila de S. Roque, na Ilha do Pico.
            Esta Ilha influenciou profundamente a sua vida e a sua poesia. A ilha imprimia-lhe um sentimento de solidão e de nostalgia. Sentia-se como que aprisionado pelo mar que o envolvia; ele via os “navios rumo ao Canadá e América”; era o mar que o impelia para a liberdade, para uma partida, para uma viagem, talvez sem regresso…
            Como que a anunciar o que poderia vir a acontecer, ele dizia no poema “Testamento” do livro “Ilha Maior”

                                   Eu hei-de sepultar o meu coração
                                   Numa fraga, junto ao mar,
                                   Vizinho da névoa e solidão,
                                   Onde as gaivotas, manhã alta, vão pousar

            Era uma mentalidade inquieta, atormentada, com angústias. E aquela solidão rodeada de mar mais ia ampliando. Sentia-se num exílio, quase num cárcere, com uma saudade imensa…sabe-se lá de quê?! Por isso, no mesmo livro, no poema  “Ilha Maior”, o tema da sua morte continuava recorrente:

                         Ilha maior no sonho e na desgraça
                        Sempre a acenar a quem ao longe passa
                        ………………………………………………………

                        Negra, negra, negra e cativa
                        Ilha Maior, minha Ilha-Mãe adoptiva,
                        Maravilha de lava e altura!
                        ……………………………………….
                        E é aqui, cavada a seu lado,
                        Que eu quero ter a minha sepultura.

E, na verdade, assim aconteceu: numa manhã de Novembro de 1977, concretizou o desejo que vinha anunciando há muito.
Almeida Firmino soube cantar as ilhas açorianas. Os sentimentos de melancolia, de saudade, de solidão… que elas geraram foram de tal modo vividos pelo poeta que acabou por se imolar, num gesto, diria, de coerência com o conteúdo da sua poesia.
Fica a memória de um Poeta mas, também, a saudade de um Amigo.

                                                                Mário Freire