Sob o signo da mudança
Pode afigurar-se redundante falar de mudança, face a ritmo vertiginoso que caracteriza a actualidade. Há que contar, no entanto, com duas atitudes opostas: Por um lado, a atracção e ânsia de mudar; por outro o receio e a resistência à novidade, dado o apreço e apego à tradição. Ao sentido de uma exigência em criar e transitar para um novo paradigma, social, económico e holístico se opõe a insegurança de embarcar numa vertigem sem equilíbrio, sem conteúdo e de rumo incerto.
Um dos obstáculos à mudança é o medo de errar, afigurando-se um contra-senso correr um tal risco. De facto é muito razoável acertar, mas não menos razoável será o facto de aceitarmos que a razão pode errar. De acordo com o parecer de Goethe, “todo o relacionamento actualizado, todo o procedimento novo e até as próprias insuficiências e erros são utilizáveis ou estimulantes, a não perder para o futuro.” No dizer de Davina Cox. "nós devemos morrer para o conhecido, previamente a fazer a experiência do desconhecido." O misoneista agarra-se à tradição, perde a flexibilidade e provoca a esclerose existencial que se opõe à evolução.
A abertura ao inédito constitui o pórtico da inovação e cria o movimento de um equilíbrio dinâmico e inovador. O neofilismo que propõe a inovação valoriza a tradição no sentido original da palavra latina tradere ou trans dare, de molde a fazer da herança um valor que fomenta a experiência, ambas propícias a um legado. Facto é que nem todo o conhecimento provém da novidade, sendo que a herança pode constituir um tesouro. Sem o destruir, é de acrescentar a capacidade de ver o antigo com olhos novos. O velho e o novo não são alternativas, mas complemento num processo permanente de análise e de síntese. Há um processo psicossintético que evita a disjuntiva e cultiva a conjuntiva conducente à síntese que excede a soma das partes.
O quadro seguinte oferece uma comparação sintética de características de dois modelos.
Modelo Formal Modelo existencial
Estaticismo – O saber é um produto acabado Dinamismo – O saber é uma descoberta
a transmitir permanente
Autoritarismo – O saber é monopólio de Democracia – O saber é um bem comum
e a controlar por quem ensina. a compartilhar.
Legalismo – Predominância da letra sobre Vivência – O saber é uma experiência
o espírito. A norma é a lei. pessoal.
Utilitarismo – O saber é um produto de Criatividade – O saber é um despertar
consumo. A criatividade está em função interior. A criatividade está em função
da produtividade. da vida.
Misoneismo – A inovação é uma ameaça. Abertura – A mudança é bem vinda.
A experiência é a garantia. A segurança está na integração.
Importa estar atento ao fenómeno iconoclasta que, fazendo tábua rasa do passado e do presente, se lança insensatamente em pára-quedas num deserto caracterizado pelo desconhecimento de si mesmo e pela desconsideração relativa a direitos e valores alheios. Não menos importante é constatar que a crise faz apelo a uma oportunidade de abertura, de vivência e de mudança, quiçá radical, a não desperdiçar.
João d’Alcor